sexta-feira, 12 de novembro de 2010

As noites eram sempre iguais...


 As noites eram sempre iguais, ela vinha, deitava-se com o Caio, contava uma de suas estórias enquanto eu a aguardava ansiosamente. “E viveram felizes para sempre”, pronto, tinha chegado a minha vez, então ela seria só minha por mais um conto de fadas. Naquela noite nem a Bela Adormecia estaria tão linda quanto a minha mãe, sua voz suave era como um sonífero e em poucos minutos eu já estaria sonhando com os anjos. Mas dessa vez a noite seria diferente, na verdade, diferente seria o dia seguinte, uma viagem com a turma da escola mudaria o rumo dos fatos. Eu estava agitado e sem sono, sonhando com a aventura, com a brincadeira no fundo do ônibus, com o banho de piscina e com passeio de charrete. Foi assim que o sonífero perdeu o efeito instantâneo, ela se foi e me deixou ali abandonado e sozinho no meio da noite. Sua saída sorrateira nem deu chance para que eu suplicasse por mais 10 minutos de sua presença.
Acho melhor ficar quieto e contar uns carneirinhos para chegar logo amanhã. Estranho, eles sempre dormem de porta aberta. Por que será que mamãe trancou a porta? Será que já estão embalando os presentes de Natal? Mas eu ainda nem estou de férias.. E o silêncio do apartamento foi quebrado com a música preferida da mamãe, a que ela sempre ouvia quando estava de bem com o papai. Eu também queria fazer parte da festa, mas de alguma forma sabia que não estava convidado. Uma angústia foi se instalando e em poucos segundos eu estava suando frio. Eles começaram a cochichar e rir, mesmo sem entender o assunto eu sabia que já deveria estar dormindo, aquilo não era  conversa para criança. Mamãe parecia cada vez mais animada e papai já não era “meu bem” e sim “gostoso”. Eu preciso dormir! Não quero ouvir isso! Coloquei o travesseiro em cima do rosto, mas não adiantou. Eles estavam fazendo aquilo bem ali, bem pertinho de mim. Será que eu vou ganhar mais um irmão? Sempre achei que eles só fizeram aquilo 2 vezes, uma para eu nascer e outra para Caio. E mamãe começou a gritar, e cada vez mais alto, será que ele estava machucando ela? Mas ela parece estar gostando. Santo Anjo do Senhor, meu zeloso guardador. Se a ti me confiou a piedade Divina, me rege, me guarde, me governe, me ilumine. Amém. Mamãe sempre falava para eu rezar que o sono vinha, mas dessa vez ele não veio. E ela gritava mais alto, ele também fazia um barulho estranho. Que raiva, odeio meu pai, ele não podia fazer isso comigo. Minha agonia parecia não ter fim. Depois de consumado o fato a porta se abriu a luz apagou e a noite voltou a ser silenciosa como deveria.  Dali em diante eu tinha uma missão: teria que segurar a mão dela bem forte todas as noites para que nunca mais ela caísse nas garras do papai até eu estar completamente desacordado.  Volta e meia acordo perturbado por essa lembrança. Aquela noite foi mesmo difícil.

Soraia, às vezes eu acho que é por isso que eu não consigo falar durante o sexo. Faz sentido?

- Bem Pedro, por hoje é só. Encerramos aqui, semana que vem no mesmo horário.

- Ok, estarei aqui.

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